Pensando sobre escolhas e contradições
É no mínimo curioso como nós humanos somos contraditórios e passamos a vida aprendendo (ou tentando) a navegar entre nossos “deus me livres mas quem me deras”.
Cheguei em uma manha comum no trabalho e o clima estava diferente, receptivo, clima de quando vai ter um papo legal antes das obrigações tomarem espaços em nossas mentes. Uma colega começou a contar sobre sua irmã que mora na Alemanha e como tudo aconteceu.
A irmã casou com um alemão e foi morar nesse país frio, segundo ela em todos os sentidos, e ela conta que se acostumou fácil com a vida por lá, já que não gosta de calor (ela morava em Cuiabá assim como eu) e nem de estar sempre em grupo, festas de família, lugares cheios de pessoas e gente falando alto e ao mesmo tempo e em todo lugar, que ela considera o “jeito de brasileiro” de ser. Porém, depois de anos morando lá começou a se sentir muito sozinha, a se entristecer com os dias nublados e frios, a sentir falta de trocas mais intimas e calorosas, de ouvir palavras acolhedoras e não apenas motivacionais como ela dizia que seu círculo na Alemanha era, ficou grávida e sentiu muita falta de uma rede de apoio, o marido é um bom parceiro, mas ainda assim foram períodos difíceis e que a faziam questionar as escolhas que a levaram até lá. Isso a fez planejar uma viagem ao Brasil, precisava desse retorno a mãe gentil, mas bastaram alguns dias em terras tupiniquins para que ela relembrasse os motivos que a faziam gostar de morar na Alemanha, e assim quando voltou fez as pazes com as dificuldades que enfrentava por lá.
Spoiler: Anos mais tarde ela entrou na mesma crise, pelos mesmos motivos.
Isso me fez pensar em como somos desejantes contraditórios, e como é difícil aprender a navegar com aquilo que passa a faltar quando você faz uma escolha.
Quando eu era adolescente isso me causava grandessíssima ansiedade, não conseguia ficar tranquila com o simples fato de que é preciso sustentar nossas contradições para conseguir escolher. Hoje me sinto mais tranquila, sinto que estou vivendo com mais clareza, do que ganho, do que perco e daquilo que nunca vou saber, por que não viverei. Não dá para viver muitas vidas em uma só, mas a vida é um movimento que nos leva a conhecer muitas de nossas versões, mesmo estando em um mesmo lugar, isso já é uma aventura e tanto.
A maturidade me fez aprender algo que considero muito importante, tirar férias das minhas escolhas é essencial para que elas continuem fazendo sentido, não trata-las como imutáveis também é importante nessa equação, assim como saber fluir com as nuances possíveis dentro de cada contexto que nossos desejos nos levam.
Hoje me vejo vivendo com mais presença, descobrindo que tem dias que vou viver de maneira mais amarga, mas na manhã seguinte a brisa doce vem, e que as minhas decisões sempre vão parecer as piores do mundo em momentos de desgosto, e também as melhores possíveis nos momentos de alegria, que não existe certo e errado ou melhor e pior, existe aquilo que faz mais sentido seguir, aquilo que ressoa de um lugar diferente no coração, que dá eco no desejo, e que tem dias que tudo vai brilhar menos e tudo bem.
Aprendi a olhar para outras vidas, outras pessoas, com admiração, escutar os aprendizados que aquela pessoa traz com a vida dela e guardar aquilo que pode fazer sentido para mim, mesmo sabendo que me conecto com outro aspecto do que é viver.
Olhar para o lado e não deixar de valorizar minha caminhada.
A irmã da minha colega, por exemplo, sabendo que apesar de gostar da sua vida na Alemanha, as vezes acha tudo monótono e cinza demais, pode escolher uma maneira de tirar umas férias disso, ou mesmo incluir em sua rotina algo que dê um pouco mais do que ela precisa, entrar em uma comunidade brasileira por lá e quem sabe encontrar pessoas com quem possa dividir questões em comum, fazer mais ligações de vídeo para o Brasil, escrever uma lista de prós e contras para se lembrar...
Sei lá. Poder fazer algo com a dor e a delícia de ter escolhido estar ali.
E agora, horas depois do papo com minha colega no início de uma manhã comum, estou eu aqui me perguntando por que estou divagando sobre a vida de alguém que nem conheço, não sei o contexto, o modo de vida, suas condições psíquicas e financeiras, alguém com quem talvez eu esteja sendo até injusta nas colocações, que não me pediu conselho algum, tampouco me perguntou como eu lido com minhas contradições, uma mulher que sequer sabe que eu existo.
Mas é que eu sou assim, não paro de pensar.