O tempo não passa, disse uma mulher meio agitada olhando pra um lado e para o outro e no relógio a todo minuto.
De repente isso me transportou para todas as vezes que já ouvi alguém dizer isso, e notei o quanto essa frase é repetida em nossos vocabulários adultos.
O
tempo
não
passa
Mas, como assim? ele esta aí presente e passando o tempo todo, muitas vezes até passa voando e a gente nem vê acontecer, do nada PUFF o tempo passou.
Me lembro que quando eu era pequena todo adulto me dizia para eu aproveitar, porque o tempo passava rápido demais, que eu tinha que brincar e ser criança o tanto que eu pudesse. Depois, já na adolescência, me diziam para continuar aproveitando (mesmo já incluindo mais responsabilidade ai) porque o tempo de final de escola e depois faculdade era o melhor da vida, ia passar rápido e eu sequer ia vê-lo acabar. De fato na faculdade todos já tínhamos essa urgência internalizada, de que precisávamos aproveitar porque logo aquilo acabaria e viria a vida adulta, logo não poderíamos mais nos comportar como jovens inconsequentes e apenas querendo nos divertir porque o tempo passa rápido demais e a gente tinha que viver isso.
A vida adulta chegou, assim como em toda nova fase, chegaram novas responsabilidades, perspectivas, prioridades e foi quando eu comecei a ouvir com uma frequência absurda que “o tempo não passa” e nunca mais ouvi dizer um “aproveita que essa fase vai passar rápido”.
Vejo os adultos por aí em grande parte ainda presos a diversões da infância para extravasar, ou ainda se comportando como adolescentes inconsequentes, ou sugados e recorrendo a estimulantes para achar o brilho novamente. Poucas pessoas entendendo o que significa estar na fase adulta e o quê de legal pode acontecer aqui onde “o tempo não passa”.
Sim, eu sei que nessa fase somos muito demandados socialmente, produtivamente, cobrados a entregar e entregar e entregar… mas a gente não precisa (e não deve) responder a T-O-D-A-S as demandas, talvez dentro da sua realidade seja possível calcular melhor tudo isso, reorganizar o tempo. Porque ele vai passar também, e se ele for bem aproveitado e conseguirmos fazer boas escolhas, outro tempo virá, e ai teremos coisas novas para descobrir, limitações novas para lidar também, mas tempo novo pra aprender a aproveitar de outro jeito, um jeito que ainda também não fazemos ideia de como vai nascer.
Será que apenas não temos repertório para fazer do tempo de ser adulto um tempo tão interessante e leve quanto os outros tempos?
Afinal, de que tempo todo mundo tem falado todo esse tempo? O que é aproveita-lo? o que significa quando ele não está passando ou está passando muito devagar? Ou rápido? Ou descompassado?
Porque não criamos, a partir de nossas vivências anteriores, maneiras de viver esse tempo onde caiba as novas responsabilidades e prioridades, mas também tenha espaço para não vermos o tempo passar?
Eu sinto o tempo como algo que está ai, acontecendo, sendo, passando, existindo, assim como todos nós paralelamente. Deixando seu rastro.
Talvez o tempo seja mais decidido que nós, implacável, continua andando e passando, não importa o que aconteça. A gente as vezes se aliena, se perde no tempo, fica imerso em sensações e preocupações e não vê que perdeu o embalo.
O tempo não passar não existe, talvez sentir isso diga mais sobre estarmos encharcados de uma realidade pouco interessante sem conseguir alcançar a potência da brisa que ele deixa quando está andando, quando estamos com pressa demais para outro tempo chegar, sem perceber que esse que esta passando agora carrega o mistério da vida e que ele tem o jeitinho dele de caminhar.
A gente muitas vezes se perde no tempo, mas ele não se perde, e nem para, ele faz o que tem que fazer, passar no tempo certo.
O tempo do tempo. Ou a gente dança, ou trava.
Eu espero que a gente aprenda a dançar e parar de querer que o tempo não ande mais devagar.
Muito provavelmente a mulher que disse que o tempo não passava, olhando impaciente para o relógio, só estava ansiosa por algo que ela queria muito que acontecesse, ou sei lá, por algo banal, talvez ela nem seja o tipo de adulto que não sabe aproveitar o tempo, mas sabe como é, eu escuto isso com tanta frequência que foi inevitável, vocês já sabem… eu não paro de pensar.