Dia desses voltei a correr, fazia isso há muito anos atrás e não me lembrava de como era a sensação, a construção da rotina com isso, no início eu quase morria em poucos minutos, mas com o tempo as coisas começaram a se estabilizar. O fôlego ganho a cada vez que você insiste em correr, os minutos a mais que você vai dando conta, os km que vão aumentando a medida que seu corpo vai se habituando a percorrer determinadas distâncias, o quanto a gente vai se sentindo mais forte e ficando mais resiliente nesse caminho. Tudo isso faz tão bem.
Comecei a ir com mais frequência também a aulas de bike indoor, já tinha tentado outras vezes, mas eu sempre ficava meio intimidada com tudo, com os grupinhos já prontos, com o professor te olhando e dizendo pra você ajustar aqui e ali, na hora de subir na bike eu mal sabia como ajustar tudo ao meu tamanho, também não tinha ideia de como soltar as mão pra fazer a coreografia sem me jogar demais pra frente e a bicicleta se mover. Ontem notei que nada disso acontece mais, muitas dessas questões já foram superadas, enfim. Agora a sensação de participar é boa demais.
Havia um sistema no meu trabalho ao qual eu nunca precisei mexer muito, mas hoje é algo que eu tenho que usar diariamente, ainda tenho muitas dificuldades pra entender o funcionamento disso, ainda fico meio perdida inúmeras vezes, aí tenho que pedir ajuda pra minha colega que tem mais experiência e depois que ela me orienta e eu entendo o caminho tudo fica mais fácil, até eu tropeçar em algo que não sei e precisar pedir um help novamente. Ainda assim, perceber que a cada dia eu preciso perturbar menos ela pra isso é gostoso demais.
E aí você deve estar se perguntando “Ok, o que isso tem a ver com o assunto relacionamentos?”, e de verdade, eu acho que... tudo.
Pensar em amor é sempre muito lúdico, é poesia, é bonito, é leve, é forte e tudo mais, mas em um relacionamento (pra mim) ele tem a função de motor.
Quando as pessoas se apaixonam e decidem fazer esse sentimento construir algo no real tudo fica muito diferente do que ouvimos sobre amor-romântico, os contornos são absolutamente diferentes de tudo que nos venderam.
Você descobre que, assim como tantas e tantas outras coisas na nossa vida, embarcamos sem saber direito como fazer aquele barco funcionar, talvez em um primeiro momento a gente consiga só focar nos sentimentos e sensações que esse momento de início traz, o mundo e a nossa energia ficam direcionados a isso e vamos navegando meio desavisados, mas a vida real chama, muitas outras coisas precisam da nossa atenção, e a gente vai precisando aprender a lidar com isso de maneira diferente, a lembrar que apesar de vocês compartilharem esse sentimento tão bonito um pelo outro, vão precisar de mais instrumentos pra além do motor pra fazer esse barco navegar.
E para mim é aí que mora a beleza e o susto de tudo, quando a fantasia desmorona e você consegue perceber que o outro ou o amor não tem as respostas que você supunha, não supre nenhuma falta e que vocês vão ter que aprender o que funciona para vocês, pra tornar essa viagem uma aventura gostosa de se viver.
Aí surge a arte de se relacionar, essa invenção que se faz entre pessoas que se propõe a mergulhar nisso de verdade. No começo a gente acha que já entendeu como funciona melhor, mas ai o tempo vai acontecendo e você precisa mudar novamente a dinâmica, quando finalmente vai percebendo que tudo sempre vai se movimentar, o mar não é igual todo dia, portanto tampouco o barco precisaria dos mesmos instrumentos sempre.
Você vai notando que se conectar com aqueles sentimentos e sensações de um início de relação e que tinham prioridade soberana sobre todas as coisas, agora é uma questão de escolha, de momentos dedicados a isso, de priorização lógica, precisa ter espaço reservado na agenda, não vai cair do céu, não é uma força espontânea que em algum momento arrebata o casal do nada. Agora precisa ser feito de maneira intencional, escolhendo qual recurso vai funcionar melhor naquele momento pra sentirem a maresia juntos e direcionar a energia pra esse lugar de novo.
Um lugar de reencontro, gostosinho e que recarrega.
Saber voltar a esse sentimento toma contornos de talento, acredito que precisa-se ter compromisso com a arte do amor no relacionamento pra isso.
Assim como tudo na vida, navegar com alguém necessita de ações, presença, dedicação, cuidado, tempo de qualidade, atenção e tudo quanto for preciso pra que a direção do barco não se perca, pra que o motor continue funcionando bem.
Como cita a psicanalista Ana Suy em um de seus lembretes: “Amor não é coisa pronta.”
Construir dá trabalho. Mas vale a pena demais.
Que a gente possa seguir ao lado de quem tem disposição e talento pra navegação.
Pensar sobre relacionamentos é uma coisa que eu gosto muito de fazer, acho que nos engrandece. Olhar para o meu relacionamento e pensar sobre ele com um olhar externo é o que me ajuda a entender quais recursos eu ainda preciso adquirir e quais eu já tenho e posso usar em determinada situação, é o que me traz autoconhecimento e o que me mostra disponível para quem está comigo. Pensem sobre o relacionamento de vocês intencionalmente, se vocês estiverem em um, lidem com o real, conversem abertamente. Se não estiverem em um, descontruam a imagem ideal do que vocês esperam de uma relação romântica, e estejam dispostos a se dedicar pra fazer a viagem ser boa.
Dedico o textinho de hoje pro meu amor, Sérgio. <3